Um hélice deve ser escolhido de modo a permitir que a rotação do motor, quando acelerado a fundo, fique dentro das rotações em que o motor foi desenhado para operar (nos motores a 4 tempos +/- 5000 rpm a 6000 rpm).
O hélice
Com o próprio nome indica, hélice está relacionadocom a palavra helicoidal. Na figura podemos ver o trajecto que a ponta de uma pá faz ao rodar. Esta é uma trajectória helicoidal.
Ao analisarmos a figura, podemos observar duas das mais importantes características de um hélice. O diâmetro e o passo.
Regra geral, um hélice com um passo pequeno, tem um diâmetro reduzido, e um passo maior implica um diâmetro superior. A relação entre estes dois factores define a potência absorvida ao motor.
A nomenclatura adoptada pelos fabricantes para classificar um hélice é do estilo 14½X17, sendo o primeiro número o diâmetro e o segundo o passo. Estas medidas são expressas em polegadas. Um diâmetro maior move mais água, mas requer mais potência, pois cria mais atrito ao rodar. O passo é talvez o factor que mais influencia o desempenho do conjunto casco/motor. Teoricamente, o passo significa que numa rotação completa do hélice, o barco anda para a frente o valor do passo (no exemplo dado 17 aproximadamente 43,2cm). Na realidade, há sempre um escorregamento que pode variar dos 100% (barco engatado e amarrado ao cais) até a uns favoráveis 10% (num casco leve em alta velocidade com o ângulo de trim adequado). Daqui se deduz que um hélice com um passo pequeno (curto) é menos veloz do que com um passo grande (longo). Se assim é, porque não usar o hélice com o maior passo que o motor conseguir aguentar? A resposta é simples. Ao arrancar é necessário colocar toda a massa do barco em andamento e um passo grande não permite que o motor suba de rotação, pois o esforço é muito elevado para a reduzida potência disponibilizada. Logo o arranque é lento, podendo o hélice cavitar facilmente. Uma vez em velocidade de planeio, queremos ter um passo maior, pois além do motor estar numa gama de potência elevada, o atrito do casco com a água, agora a planar, é muito inferior. Por outro lado, um passo pequeno permite um arranque com grande autoridade, pois o esforço induzido no motor é menor e este sobe de rotação rapidamente, contudo facilmente se chega ao regime máximo de rotação do motor e a velocidade do barco não é elevada. A escolha do hélice é sempre um compromisso.
Materiais utilizados
O material de fabrico dos hélices é muito variado, devendo ser escolhido de acordo com a utilização que irá desempenhar.
Para baixas potências existem hélices em materiais compósitos (Plástico reforçado com fibra). Em alguns destes modelos, as pás são substituíveis individualmente e a sua resistência à corrosão é excelente. Os hélices realizados em liga de alumínio são baratos, existem numa grande variedade de dimensões e têm uma performance adequada ao custo. Como inconvenientes salienta-se o facto de serem mais frágeis e algo menos performantes que os hélices de inox devido, em parte, ao desgaste que o uso provoca e à deformação que poderá vir a ter com o uso. Os hélices de aço inoxidável – são na realidade feitos de uma liga de aço inox, pelo que não se admire se colocar um íman e verificar que este é atraído para o hélice – isto não significa que o hélice não contenha inox. O seu preço elevado não é seguramente uma vantagem, essas são contudo evidentes quando falamos em utilizações com potências e pesos elevados em mar aberto. O perfil hidrodinâmico é mais adequado, pelo que a eficiência do hélice é maior. Nos hélices inox de grande qualidade, a resistência à corrosão é muito boa e há sempre que ter em linha de conta o inegável bom aspecto do hélice a brilhar. Existem fabricantes que optaram pelo fabrico de hélices em inox mas, em preto que permite reduzir o custo e aumentar a duração ânodo-zincada na água salgada através da redução das partes expostas do metal.
Existem vários tipos de hélice para diferentes aplicações
Para cascos de deslocamento. Para este tipo de casco existem vários tipos de hélice, incluindo aos mais usuais, as hélices de pás dobráveis, úteis para diminuir o atrito num veleiro, e hélices de grande impulso, caracterizadas por pás com uma grande área frontal e de pontas arredondadas.
Para cascos de planar. Os hélices mais utilizados são os simples de três pás que trabalham submersas.
Existem hélices de passo variável automaticamente consoante a rotação e o impulso exercido. Estes hélices são curtos no arranque, mas aumentam o passo quando a velocidade aumenta. O seu funcionamento é completamente mecânico e de dimensões iguais a um hélice normal.
Em cascos leves e de alta velocidade, para contrabalançar o compromisso arranque/velocidade, existem hélices que ventilam as pás, ficando estas dentro da zona de saída do escape, ou outras que têm furos na lateral do cubo, com o objectivo de fazer com que o gás de escape se misture na raiz das pás, o que causa um grande escorregamento e uma consequente subida de rotação do motor, onde este desenvolve potência, permitindo um arranque mais enérgico.
Uma novidade no mundo dos hélices é o sistema IPS desenvolvido pela Volvo, e que consiste em colocar o hélice no lado da frente da coluna. Como vantagens deste sistema, podemos salientar que o hélice corta a água estando esta em repouso, isto é, não há turbulência nas pás, ao contrário do que acontece com um esquema usual. Isto permite um trabalho muito mais eficiente do hélice. Linearidade, suavidade e precisão na direcção são apanágios desta solução. Contudo nesta configuração, o hélice está mais sujeito a danos causados por impacto em objectos submersos.
Casos especiais. Em instalações múltiplas de dois ou mais motores, é necessário ter atenção ao sentido de rotação dos hélices. Para dois motores (ou pares de motores), o de estibordo será o motor de rotação normal (as pás rodam no sentido dos ponteiros dos relógios), e o de bombordo o de rotação inversa, para assegurar um leme neutral e fácil manobralidade e para contrabalançar as forças de rotação inerentes às hélices. Em instalações impar, o motor central será de rotação normal. Esta norma deve-se observar, para que o esforço e performance ao curvar seja igual para ambas as direcções, e para que ao acelerar, o casco não adorne no sentido inverso ao dos hélices. Com os dois motores de rotação contrária, este efeito é equilibrado. De salientar que este efeito é anulado usando colunas com hélices TRP – duas hélices montadas no mesmo veio uma a seguir à outra que rodam em sentidos diferentes.
Problemas que podem surgir
Um conjunto hélice/motor/casco que não esteja bem afinado não terá uma performance satisfatória. E como cada caso é um caso, deverão ser experimentados vários hélices antes de se tomar uma decisão final.
Um hélice tem manutenção, quanto mais não seja, assegurar que está em bom estado. A eficiência de propulsão sofre imenso se o perfil hidrodinâmico da pá for perturbado com amolgadelas, desgaste, ou limos. Um hélice danificado tem uma reduzida propulsão, causando uma baixa velocidade e aumento de consumo do motor.
Se ao acelerar, o barco parecer que está em ponto morto, pode-se dar o caso de o hélice rodar em falso porque o cinobloco no interior está danificado. Nestes casos, muitas marcas vendem este cinobloco, mas a reparação e posterior equilíbrio do hélice deve ser realizado por um profissional experiente. Outro caso possível é que tenha um hélice com o passo muito grande e esteja a cavitar. A solução é colocar um hélice com um passo mais reduzido.
Não existe uma resposta definitiva para o hélice indicado para o seu barco. A escolha de um hélice é um compromisso que depende de muitos factores distintos como o peso e sua distribuição, casco, potência, tipo de utilização entre outros. A melhor solução é a que satisfaz a utilização primordial do seu barco.
Glossário de Termos Técnicos:
Escorregamento: é a diferença expressa percentualmente, entre a distância que um hélice iria teoricamente avançar com uma rotação completa e a que realmente avança. Esta diferença é devida ao ângulo de ataque que a pá precisa ter para puxar a água. O escorregamento diminui à medida que a velocidade aumenta, pois a água está a ser empurrada para a pá, efectivamente diminuindo o ângulo de ataque da pá.
Ângulo de ataque: é o ângulo que a corda da pá (não a pá) faz com a direcção do fluxo de água. À semelhança do que acontece com a asa de um avião que precisa de ter algum ângulo de ataque, a pá tem também um pequeno ângulo de ataque para poder realizar movimento para frente. Até um certo ponto, aumentar o ângulo de ataque corresponde a um maior impulso, mas o atrito e a potência necessária aumentam muito! passar esse valor do ângulo e o hélice cavita 100% escorregamento.
Área frontal: área total da face das pás.
Diâmetro do hélice: é o círculo imaginário que toca na ponta das pás. Podemos fazer a analogia do diâmetro do hélice à largura do pneu de um carro. Mais tracção, mas maior atrito em velocidade.
Passo do hélice: é a distância teórica que o hélice avança quando perfaz uma rotação completa. Podemos fazer a analogia do passo do hélice ao diâmetro do pneu de um carro. Maior diâmetro, maior velocidade.
Cavitação: é a formação de vapor de água, devido à baixa pressão que se cria na parte de trás do hélice. Isto gera turbulência na parte posterior da pá, o que vai estragar o seu perfil hidrodinâmico.
Em acção
Nas águas de Oeiras fomos experimentar, a bordo de um barco de pesca desportiva desenvolvido pela Yamaha e equipado com um motor de 150 Cv, cinco hélices com difererentes carcaterísticas. A bordo seguiam três adultos e as condições de mar eram boas e, praticamente, sem vento.
Algumas características sobre os hélices utilizados no teste. As hélices em aço inox preto são desenhadas para uso geral e como principais características temos as pás que são finas, eficientes e mais duráveis do que as feitas em alumínio. As hélices em aço inox polído oferecem uma maior performance do que a série padrão em aço inox, são desenhadas para motores mais potentes, a partir de 150 Cv. As offshore é uma hélice topo de gama concebida para barcos de maior porte e com motores potentes. O ângulo agressivo das pás da hélice e o efeito de copa extra oferecem uma eficiência superior a meia rotação além de uma boa performance.
Medições
Hélice em alumínio de passo 15
A planar em 2,52 s
Mínimo a planar 2700 rpm / 10 nós
Até às 5000 rpm em 6,42 s / 15 nós
Consumo às 5500 rpm / 31 nós 61 L/h
3000 rpm / 12 nós
3500 rpm / 16 nós
4000 rpm / 19 nós
4500 rpm / 25 nós
5000 rpm / 28 nós
5500 rpm / 31 nós
Medições
Hélice em inox black de passo 15
A planar em 3,08 s
Mínimo a planar 2800 rpm / 11 nós
Até às 5000 rpm em 8,65 s / 17 nós
Consumo às 5400 rpm / 31 nós 60 L/h
3000 rpm / 12 nós
3500 rpm / 16 nós
4000 rpm / 20 nós
4500 rpm / 23 nós
5000 rpm / 27 nós
5400 rpm / 31 nós
Medições
Hélice em inox polído offshore de passo 15
A planar em 2,75 s
Mínimo a planar 2700 rpm / 9 nós
Até às 5000 rpm em 11,48 s / 19 nós
Consumo às 5200 rpm / 29 nós 56 L/h
3000 rpm / 11 nós
3500 rpm / 15 nós
4000 rpm / 20 nós
4500 rpm / 23 nós
5000 rpm / 26 nós
5200 rpm / 29 nós
Medições
Hélice em inox polído de passo 17
A planar em 2,22 s
Mínimo a planar 2800 rpm / 10 nós
Até às 5000 rpm em 8,94 s / 12 nós
Consumo às 5300 rpm / 30 nós 56 L/h
3000 rpm / 11 nós
3500 rpm / 15 nós
4000 rpm / 19 nós
4500 rpm / 24 nós
5000 rpm / 26 nós
5300 rpm / 30 nós
Medições
Hélice em inox black de passo 17
A planar em 2,70 s
Mínimo a planar 2800 rpm / 10 nós
Até às 5000 rpm em 6,53 s / 11 nós
Consumo às 5400 rpm / 30 nós 57 L/h
3000 rpm / 11 nós
3500 rpm / 15 nós
4000 rpm / 17 nós
4500 rpm / 24 nós
5000 rpm / 26 nós
5400 rpm / 30 nós