Na passada sexta-feira (16.11.2012) à noite teve lugar, no Salão Nobre dos Paços do Concelho da Póvoa do Varzim, uma conferência proferida pelo Comandante Luís Adriano Cesariny Calafate intitulada Reencontro com o Mar.
A atividade, que encerrou as comemorações municipais do Dia Nacional do Mar, contou com a presença de José Macedo Vieira, Presidente da Câmara Municipal da Póvoa e Presidente da Rede Nacional de Cultura do Mar, e Henrique Souto, Vice-Presidente da Rede Nacional de Cultura do Mar e em representação da Sociedade de Geografia de Lisboa.
No seu introito à conferência, José Macedo Vieira disse que o mar não é apenas um meio mas um fim em si mesmo. E que, se está disponível para nos levar a outras paragens, aprecia sobretudo que regressemos, e que nele nos concentremos.
E sobre a história do nosso país, inevitavelmente ligada ao mar, o edil referiu e Portugal, que pelo mar deu novos mundos ao mundo, e assim impulsionou grandemente o processo de globalização. Sempre que aqui nos sentimos mal, ao mar nos fizemos, e noutras terras vizinhas do mar nos estabelecemos e fixámos. Até que dessas terras nos afastámos e, no regresso, ao mar virámos costas.
E assim vivemos anos a fio, iludindo-nos em miragens que depressa se desvaneceram e nos conduziram ao atual sufoco, constatou o Presidente, acrescentando que preferimos ser periféricos numa Europa fechada em si mesma a ser centrais numa Europa que assuma a sua fachada atlântica como vetor geoestratégico para a competitividade à escala global.
Neste sentido advertiu o mar é, hoje, um desígnio nacional irrenunciável, imperioso, urgente. Mesmo que a Europa queira continuar distante do seu velho e fundador eixo euro-atlântico, Portugal deve regressar, e em força, ao seu mar o país, no seu todo: o governo central, as autarquias, as empresas, apostados em criar riqueza e postos de trabalho para os portugueses. É que, se Portugal detém hoje, graças aos seus territórios atlânticos, uma grande plataforma continental, estamos em vias de ultrapassar, neste domínio, a Noruega, o atual gigante marítimo europeu. O país pode, em breve, ter no mar uma extensão de território equivalente à da Índia, com tudo o que isso potencia em domínios tão vastos como a investigação científica, o desenvolvimento tecnológico, a geologia, a energia, o turismo, o desporto, as pescas. O futuro não é outra coisa senão o passado dinamicamente atualizado.
Evidenciada a importância do mar a nível nacional, José Macedo Vieira definiu-o também como desígnio municipal, salientando que tive a possibilidade de promover a reconciliação que tardava, devolvendo à população o espaço da enseada, outrora um agressivo depósito de lixos e mercadorias, e recriando assim a velha relação de proximidade, que se perdera.
Se a nossa Póvoa, algum dia, para nosso mal, deixasse de ser terra de pescadores, nunca deixaria de ser terra de mar que essa é a boa fatalidade genética a que estamos solidamente associados, afirmou Macedo Vieira, advertindo que teremos de ser terra de mar, mas de um mar fecundo local de pesca, local de recreio, local gerador de energia, local de estudo e de tudo aquilo a que o estudo conduza. Teremos de ser terra de mar, e do que dele vem. Teremos de acentuar a vertente marítima da nossa gastronomia urbana. A gastronomia com origem no mar tem de voltar ao ADN da nossa vivência urbana. Teremos de ser terra de mar e das novas atividades a ele associadas: a náutica de recreio, a náutica competitiva, a vela, o remo, o surf, a natação em águas livres. Teremos de desenvolver uma cultura de mar, não apenas pela revivência histórica da faina piscatória dos nossos antepassados, e dos mitos a ela associados, e das marcas que deixou na nossa memória coletiva e particularmente na nossa colmeia piscatória, mas também na vertente do turismo cultural com génese no nosso património marítimo, de que é expressão maior a Lancha Poveira do Alto, cuja presença no mar deve ser mais assídua. A próxima fase de desenvolvimento do município deverá ser orientada por este projeto de consolidação da componente marítima da nossa identidade.
O Comandante Luís Adriano Cesariny Calafate começou por reconhecer que é animador voltarmos a ouvir falar do mar sem os complexos do fim do Império mas sim numa perspetiva de futuro com inteligência e vontade de aproveitar de forma sustentada aquilo que generosamente nos oferece.
O Capitão da Marinha Mercante informou que para potenciação económica e proteção desta enorme riqueza que é a zona exclusiva de Portugal, 18 vezes maior que o seu território terrestre, a maior da União Europeia, uma das maiores do mundo (11ª), e havendo ainda a hipótese de ser aprovada pelas Nações Unidas a proposta de extensão da plataforma continental que aumentará a área marítima sob soberania ou jurisdição portuguesa para mais do dobro da atual, isto é, 42 vezes no total, ficando assim unido pelo espaço marítimo o continente às regiões autónomas contrariando a nossa ideia de pequenez, parece-me indispensável que o país assuma um papel de liderança neste setor, rentabilizando esta vantagem.
O Comandante considera que é necessário assumir, numa perspetiva transatlântica, que somos um país central e não periférica tirando partido dessa posição estratégica de cruzamento de rotas intercontinentais e criar uma política portuária que atraia os navios aos nossos portos. Aproveitando também o crescimento das viagens de cruzeiro e a sua passagem pelos portos portugueses, criar empresas turístico-marítimas com programas de visitas em terra para que os passageiros conheçam o nosso país e incrementar as riquezas do mar como via de ligação dos continentes com transportes marítimos.
Luís Adriano Cesariny Calafate enumerou os diversos aproveitamentos e benefícios que o mar nos fornece nos mais variados setores e áreas de atividade referindo-se também ao sistema de produção de energia elétrica a partir das ondas do mar instalado ao largo de Aguçadoura, na Póvoa de Varzim.
Para o Capitão da Marinha Mercante, a entrada na EU foi um passo importante para quebrar com o nosso isolamento político mas nunca devíamos ter voltado as costas ao nosso património marítimo cuja sua presença física se nos mantêm fiel. A grande fronteira com o mar não é uma fatalidade, é uma mais-valia, advertiu.
No sentido de assinalar as potencialidades do mar, afirmou que tendo nós um território com um grande litoral e fronteira terrestre apenas com um país, o governo tem obrigação de assegurar a entrada de bens de consumo básico por via marítima, pois, neste momento, não temos navios de comércio suficientes. Será necessário também investir na marinha mercante; criar condições de trabalho e de habitabilidade a bordo que atraia os jovens e mantenha os mais antigos para que haja no setor estabilidade e profissionalismo; integrar as várias tutelas ligadas ao setor; descentralizar, em todos os campos, apoios aos marítimos; é preciso investir nos recursos humanos; promover a investigação para melhorar a gestão do setor, entre muitos outros explanados pelo conferencista.
Os portugueses têm uma ligação afetiva ao mar mas esquecem o seu potencial e peso na economia do país, advertiu, acrescentando que dar novo impulso ao setor exige uma visão estratégica e conjugação de esforços que vai muito além da legislação. A tutela deverá ter vontade política para concretizar o aproveitamento das riquezas do mar. É um empreendimento que exige um grande esforço de todos nós. O mar não é um obstáculo mas sim um elemento de ligação e aproximação dos povos e culturas com enorme repercussão na economia.
Na esperança de ter contribuído para uma maior ligação dos portugueses ao mar e para o reconhecimento da importância que o mar pode ter para a recuperação económica do país, Luís Adriano Cesariny Calafate conclui a sua intervenção recorrendo ao título de uma obra do seu avô Caetano Vasques Calafate Verbo, vigor e ação: faço votos para que o verbo com vigor lusitano se transforme em ação neste reencontro com o mar.
A marcar o Dia Nacional do Mar, houve sessões educativas nas Escolas EB 2/3 do concelho “O Mar é Património”, por Manuel Costa, sensibilizando as crianças e jovens para a salvaguarda da memória das embarcações tradicionais poveiras, do património naval, abordando as artes da construção naval e da navegação. Na Escola EB 2/3 Dr. Flávio Gonçalves, houve uma Hora do Conto, na qual a obra A Menina do Mar de Sophia de Mello Breyner Andresen foi narrada aos alunos. Os utentes da Beneficente e população em geral visionaram o filme “Ala-Arriba” de Leitão de Barros, na Biblioteca Municipal.